quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Fernando e Natália

Estávamos na segunda ou terceira semana do novo emprego, voltando para nossas casas a noite. Caminhávamos por um trecho que me lembro muito bem: Dutra paralela com a Sete de Setembro e Prudente de Morais.

A ocasião não me recordo com precisão. Poderíamos estar falando de mulheres, sempre falavamos sobre mulheres. Filosofando sobre a vida. O que foi importante é que disse para Fernando: você não encontra motivos para mudar, então, sempre será essa pessoa infeliz. Hoje as palavras pesam em meu coração como uma maldição. Seis anos depois, sinto que ele continua o mesmo, mais responsável, mas igual nos defeitos.

Em alguns pontos, quebrei barreiras que ele não conseguiu. Fernando se prendeu em uma história de amor, eu deixei sangrar muitas delas. Quem é capaz de esconder sua tristeza é ainda mais infeliz. Ajudaria se me pedisse. Mas nunca compartilha seus sentimentos. E não cabe a mim remover camadas que ele mesmo inseriu na vida.

Quando Fernando e Natália se separaram algumas amigos insistiram que deveriam ter mantido a relação. Perguntavam de um retorno, talvez pelo costume de vê-los juntos. Minha opinião sobre o caso é que ele era feliz. Ela parecia também. Porém, novos demais enfiaram espinhos profundos em um e outro.

Mas, ainda estão ai. Há doze anos se conhecem, dez deles separados. Ele em vazio. Ela após três namorados. Tento compreender quais são suas motivações para nunca ter se envolvido com outra mulher. A mesma timidez juvenil que ainda persiste em estar presente?

O homem fez trinta e um anos. Tem coração de ouro, cuida da mãe, mas não parece que tem domínio de si. Como se vivesse subjugado. Não que isso transpareça com a maneira que lida com quem está a sua volta. Digo isso pois o conheço.

Não sei se após esse anos Fernando mente ao me dizer que se importa com Natália. Que ainda se importa com ela ou tem um sentimento vivo. Depois de três anos cuidando dela como a única mulher do mundo, pode ser que ele se esqueceu de outra maneira de trata-la.

Não quero soar agressivo. Adquiri maturidade suficiente para me depreender de relações desequilibradas ou aquelas que contém um passado nostálgico do que um presente vivo. Afinal, o que os liga ainda hoje e os mantém próximos? Não sei quem seria capaz de, a essa altura, defender o discurso íntegro da amizade acima do bem e o do mal. Pouco se falam, mas não se deixam para trás. Como se convencidos a escolher uma pessoa como sua, aquela que não será desagarrada em nenhum momento. Parece nobre, mas tão frágil. Um homem que não desiste de alguém não faz necessariamente a escolha correta.

Quando nos conhecemos conversamos sobre sua maneira de ser. Um adolescente, na época, que acreditava nas pessoas e não desistia em vão. Ao mesmo tempo que sei quanto desistiu de seus sonhos. Portanto, não compreendo porque Natália é tão especial, tão significativa hoje além do passado tortuoso.

Eles estão juntos pela proximidade. Pela constatação de que mesmo sem nenhum assunto em comum não vão se deixar. Estarão presentes um para o outro como um pacto silencioso entre humanos. Pelo apelo de não ficarem completamente sós.

Por isso, acho que ainda terminarão juntos novamente. O tempo progride, voltas do parafuso cada vez mais doloridas e, no fundo, só se separarão com a morte. Ela aceitará seu carinho como o único homem, além do pai, que não a abandonou. Ele retomará a relação no ponto de onde pararam, na curva do futuro em que o carro começava a sair da pista. Imagino que se aproximaram pelo medo de perder a única pessoa que lhes mantém afeto,.

Durante esses doze anos, esperei que um dia fosse possível compreender que se tornaram diferentes. Que depois de perdas se recompuseram melhores. Mas tudo estava igual. Como há um ano. Semelhante a dois. Emparedado como Antígona há mil anos. Por isso, nunca se deixarão.

Foi quando eu soube que eles envelheceriam um ao lado do outro. A margem de algum abismo.

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