sexta-feira, 23 de outubro de 2009

almas gêmeas

Eram silenciosos. Calmos. Introspectivos, mesmo.

Conheceram-se de relance, numa passagem por aquela cidade lá. Foram apresentados, sorriram, perfeitos um para o outro.

Eram calmos e falavam pouco. Sem arroubos.

Como estavam de passagem, foram logo. Um para um lado, outro pro outro. Não eram de se animar demais com nada.

Perfeitos uma para o outro. Foram embora sem se falar.

terça-feira, 13 de outubro de 2009

Em Seu Lugar

A seqüência de ladrinhos estava molhada. Secando com o calor que fazia naquele fim de tarde. A sala cheirava a limpeza e, prostrado em um canto, evitando sujar o trabalho feito, ele esperava pelos minutos que pudesse volta a se locomover sem criar uma trilha suja pelos sapatos.

Como um artesão, que completa uma obra de arte, admirou seu trabalho. Naquele ambiente, tudo estava em seu lugar. As peças formavam novamente um par, as revistas se reencontravam em sua pilha habitual, e até mesmo os móveis exalavam um cheiro de limpeza raro, sem a poeira que, de costume, os cobria.

Refletiu, “alguém que não me lembro, disse, uma vez, que quando respondemos as respostas que nos cercam, inevitavelmente, surgem mais perguntas”. E assim, tornou a olhar sua obra, analisando que o caos que vivia em seu ambiente, ajudava a turvar seus pensamentos. A casa limpa dava espaços em brancos para fazer com que a mente se perdesse em novas perguntas.

Deitou-se, vendo a brancura do teto refletir sobre paredes e no chão, agora ausentes de seus papéis e de seu desarranjo em manter a ordem. “Os espaços vazios parecem que esperam uma resposta de mim, como homens ansiosos por uma atitude”.

Como os pingos de chuva que agora caiam lá fora, em sua mente brotaram-se diversas perguntas. Mas era incapaz de responde-las. Sentiu-se menor. Sabia que se espalha-se as revistas de volta no chão não encontraria a paz dessas palavras que lhe invadiam a cabeça.

Foi até o espelho e observou-se. Velha face conhecida. Sorriu, observando quantos vincos um simples sorriso produziria em seu rosto. Eram poucos, ainda. Bafejou no espelho e, enquanto o calor não dissipava no vidro, fez um símbolo de interrogação.

A dúvida era a circunstância que mais lhe incomodava nesse instante. Como se caminhasse por ladrinhos que não conhecesse, como se não fosse capaz de visualizar o passo seguinte. Sem saber se pisaria em terra fofa ou cairia em um abismo. Voltou para a cama, refletiu. Estava a sombra de si mesmo.

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

da zaga

Gavilanes era peça chave na seleção de 84. Seleção paraibana. Na época foi convocado até mesmo pro time do Crato, primeira divisão. Faz alguns anos, isso, e Doris esteve com ele desde o começo.

Desde antes, desde a série E, desde bem antes mesmo. Sempre se amaram. Felizes, planos e prestações vencidos, conquistados. Casa própria em outro estado, salário fixo e mesmo uma pensão prevista, pra caso o fim da vida. Dele.

Gavilanes ia mudar, agora, de time e de lugar. Era um jogador modelo, exemplo, zagueiro e capitão. Isso desde antes da seleção: Gavilanes era um jogador perfeito, justo e pacífico. Um fair play. Gabava-se apenas de nunca ter, nunca, levado um vermelho. Só mesmo um cartão amarelo, uma vez, que ele admitia. Merecera.

Doris não o aguentava mais. Tinha a casa, tinha a pensão... Não ia mais mudar de canto, aos 30 e tantos, com quatro filhos na mão e outro no buxo. Ele que fosse sozinho. Era um jogador exemplar, não era? Era justo e a perfeição, não era? Ele que fosse sozinho.

Um homem bom não faz falta.