segunda-feira, 7 de novembro de 2011

quietação

José tinha dois papéis nas mãos. Na direita, um bilhete ou um poema. A garçonete não sabia dizer olhando assim, de longe. Na esquerda era um poema, com certeza. José tirara da grande mesa literária à entrada do Clube, onde poetas vagabundos deixam suas poesias vagabundas para ver se, algum dia, alguém os lê ali. No Clube é desse jeito: entre e faça o que quiser. Se Joshua não gostar, te enfia um pontapé no rabo e nunca mais te abre a porta. Um lugar democrático, afinal.

A garçonete estava curiosa. Já vira José sentado ali na outra noite, meio chorando meio bebendo, com um sorriso no rosto, e na mão esquerda o mesmo papel que hoje trazia na direita. O bilhete-ou-poema. E, na outra noite, lia incansavelmente o papelzinho. A garçonete tentara olhar o que havia, ao tirar os copos, mas não conseguira. Parecia que não havia nada, até...

José hoje não sorria, não chorava e não bebia tanto quanto antes. Mas bebia, ainda assim. E lia atentamente o papel da mesa literária, e olhava atentamente os homens tocando no palco. A garçonete não percebeu mas, a certa altura, José até mesmo observara atentamente o movimento de sua bunda enquanto andava.

Joshua riu. No palco tocava Big Band Voodoo Daddy. O poema na mão esquerda parecia escrito pra ele, José, de um velho poeta que não ia ao Clube mais.

"Olho em redor do bar em que escrevo estas linhas.
Aquele homem ali no balcão, caninha após caninha,
nem desconfia que se acha conosco desde o início
das eras. Pensa que está somente afogando problemas
dele, João Silva... Ele está é bebendo a milenar
inquietação do mundo!"

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