quarta-feira, 7 de julho de 2010

Carne (Quase) Viva

Quando eu estava no leito do hospital sendo tratado, imaginei que as luzes que se apagavam era apenas uma pane geral. A médica comentou que, mais cedo, isso já tinha acontecido. Mas os gritos ensandecidos e um barulho de passos truculentos fizeram com que, instintivamente, eu me escondesse. Retirasse o aparelho preso a minha costas, e corresse para debaixo daquela cama de hospital que, encostada na parede, parecia um bom lugar.

O peso do barulho me deixava imóvel, ainda que curioso. Quando os passos se aproximaram de mim, me encolhi o mais rápido que pude embaixo daquela cama, mas vi as sombras trôpegas e sangue a espirrar.

Não sei quanto tempo estive escondido. Sei que quando sai, as paredes brancas do lugar e sua paz foram mudadas por um vermelho violento estampado no chão. Estavam mortos, a maioria das pessoas e, as poucas ainda vivas, apresentavam horríveis marcas, mordidas dadas com sede e vontade.

Para não dizer que era o único, éramos sete sobreviventes naquele hospital. Vivos sem nenhuma ferida. Um deles que, se não salvo por mim, ao abrir a câmara hiperbárica, ficaria lá até morrer de fome.

Do alto do hospital era possível vizualizar o caminho que traçavam, como predadores que eram. Entravam, devastavam mas, ao invés de ficar devorando as vísceras, rumavam para outro lugar. Fato esse que me permitiu estar vivo até agora.

Ao contrário do que se imagina, visto que mesmo com uma força sobre humana, eles não são capazes de derrubar satélites, boa parte da comunicação permaneceu ativa. Ao contrário da força, essa sim cessada.

Dessa maneira que descobrimos o evidente. A escala global atacada. A população diminuindo aos poucos e rapidamente depois.

Pessoas davam sinal como podiam. Eu vi, pela primeira vez, um daqueles tiros que iluminam ao ar. Vi escrito em sangue “Socorro” quando era tarde demais. E dezenas de mensagens que não paravam de congestionar o que sobrou da rede, confirmando cada local dizimado e a localização dos sobreviventes. Não que existisse força armada suficiente para tal.

Foi assim que resolvi escrever. Ser mais um a dizer como tudo começou, meu pânico inicial e a sensação livre de saber que o fim chegou. Não o seu fim único, mas o de todos nós.

Quando você estiver lendo isso, eu já estarei morto e, provavelmente, a cidade inteira estará deserta, exceto por eles. Saibam que aqui não é um bom lugar para tentar fugir para começar algo novo.

Não se esqueça de fazer aquilo que quiser nas próximas horas, pois, se você ainda está vivo e respirando, daqui a pouco estará sendo devorado.

Saúde.

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