quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Nanda

Fui até a cozinha, coloquei um desses copos translúcidos sobre o mármore e peguei a vodka. Deixei o líquido escorrer até abaixo do meio. Na geladeira, peguei o suco de laranja. Me senti um desses escritores marginais.

Mas tudo não passava de uma piada. Sexta feira, quatro da tarde, e eu sentado na cama, na frente do ventilador tomando a bebida preferida do Keith Richards. Não sei beber, só queria fazer pose. Justificar a tristeza.

Olhei para o alto, onde guardo meus dois violões, em cima do armário. Peguei o vilão de folk. Comprei de um vendedor online há algum tempo, oitocentos reais, Fender, um som maravilhoso que nunca soube tocar.

Sentei na cama um tanto entorpecido. Tentei tocar Bruce Springsteen. Não consegui. Fui pra cama para dormir, mas doía-me as costas e a vida. É um clichê. Mas doía. Tenho direito a não me sentir bem também.

Voltei a cozinha. Tomei dois clonazepam e dez gotas de rivotril. Queria dormir, mas a sensação deixou tudo calmo. O coração desacelerou enquanto lá fora o céu se encobria de negro. Amo a negritude do céu.

Estique-me na cama até tocar no bojo do violão. Entendi os blues man. Nunca toquei um som tão triste quanto meus acordes no escuro. Cada nota procurando outra nota que chorasse com mais soluços que a anterior. Permaneci por uma hora alternando melodias e cantando desafinado tentativas de canções. Mas a língua portuguesa não nasceu para o folk. Soa desengonçada. Não tem a sonoridade e nem o sotaque certo para cuspir pedaços da alma.

Eram quase oito horas. Estava com fome. Como disse, alguns homens nem mesmo sabem a maneira correta de se sentir triste. Eu tinha bebido, tomado meus barbitúricos, e até o fim da noite eu iria comer uma pizza e tomar sorvete.

Se homens tem lados femininos esse é o meu. Quando triste gosto de encher meu corpo de gordura. Sentir as artérias se fechando, uma a uma, pedindo por favor para se manterem vivas. Então, ela chegou. Acendeu as luzes da cozinha de modo que vi apenas seu semblante. Caminhou até a cama onde eu estava convalescido – porque alguns homens caiem em um desespero tão grande que acham que, na tristeza, vão morrer – e me deu um beijo na boca. Um beijo longo, molhado, e desesperado para mim que estava, até então, no inferno.

Aquela mulher salvou meu dia.

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