terça-feira, 21 de julho de 2009

Mãos Dadas

“Amor consiste em duas solidões que protegem,
aconchegam e apóiam uma à outra.”
Rainer Maria Rilke


As mãos dadas são um dos símbolos mais felizes que posso conceber em minhas memórias. A divisão mutua do calor, quando acrescido do amor, é uma dessas sensações belas e inexplicáveis, devo confessar. Andar de mãos dadas é tão profundo que enriquece poemas e canções. O toque das mãos é o início de tudo, mãos que se tocam e depois encontram o corpo de seus pares.

Há quem diga que uma mão entrelaçada parece com um coração. Outros vêem o visível aos olhos, de que o contato é um elo íntimo. Uma prova do amor. Duas pessoas formando ali um único ponto.

Nunca compreendi, ao certo, o movimento do amor. Tenho mais costume por sua ressaca do que pelo seu sabor fresco. Assim, enigmático para mim é a transformação do duplo em uno. Um casal que se ama e se entrelaça formando um só.

Duas pessoas que trilhavam caminhos diferentes agora não só seguem juntos um horizonte, como parecem perder o esquife que determina aonde começa um e outro. Perdem primeiro sua identidade para, no final, perderem o amor e depois o amor pela vida.

Não há mais a primeira pessoa no vocabulário. Os planos viram projetos para um par. Eu se transforma em Nós. Nós acabam machucando quando bem atados.

Onde um vai o outro está. Perde-se o aconchego próprio, o tempo necessário para ouvir a própria escuridão. Com as luzes apagadas é confortável saber que uma mão amável está por perto, para salvar de um susto. Mas perde-se as horas para chorar sozinho. O tempo de lamentar-se para a lua, brincando ser um lobo que uiva. Amar é não dar espaço para a matéria de que somos feitos, a solidão.

Nunca compreendi esses casais que começam a tratar a si mesmos como uma entidade superior. Uma dupla que, por estarem em dois, tem mais valia do que os solitários. Saem em parceria com outros casais, fazem reuniões daqueles que fingiram se fundir em um. Fazem questão de dividir os times. Os saudáveis e o clube dos corações solitários.

Falam o tempo todo na pessoa amada, não por amor. Mas pela dúvida em amá-la de verdade e perceber, no meio do dia, que seus pensamentos estão em outra pessoa. Repetem seu nome como feitiço conjurado, como uma oração. Para lembrar que estão unidos, mesmo que o silêncio apareça mais que o verbo.

As batalhas que escolhi lutar em minha vida foram positivas e me ajudaram a definir quem sou. Foram preciso marcas, dores, muito sangue escorrido pela boca, para agora admirar minhas cicatrizes e saber que me conheço. Pouco, evidente, mas posso dizer que sei daquilo que gosto.

Gosto dos amores que não censuram. Dos caminhos que são feito juntos não por obrigação ou unidade, mas pela simples vontade de estar de mãos dadas e caminhar, até as pernas doerem para um descanso breve. Caminho feito a quatro pés. Amores que não se consagram em nós. Amores que definem bem que duas pessoas compartilham o mesmo amor e não a mesma voz, o mesmo corpo, a mesma perfeita sintonia.

A parte disso, sou um daqueles poetas que nunca aprendeu a amar. Vivo na solidão única de mim, sabendo que assim, ninguém poderá me perder. Nasci para não saber amar. Morrerei só, com a mesma sentença dos amantes. Mas lúcido, sabendo que dentro de mim permanecerei eu mesmo.

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