Há vinte anos, o roqueiro brasileiro Zeike Good lançava um dos discos mais emblemáticos da década de oitenta. Influência para diversas bandas do rock paulista, mesmo longe do sucesso público, El Cru, foi o segundo álbum do músico, lhe dando o status em que até hoje é lembrado: um homem mal amado.
Composto em vinte e seis dias, o título que parece remeter-se a uma expressão hispânica é apenas uma troca das sílabas da palavra Cruel. Nas palavras do autor, uma anotação lida ao contrário pareceu mais sonora do que o título inicialmente pensado para a obra.
As doze canções que compõe o álbum formam um enredo sobre a perda amorosa. Good separou-se após um relacionamento de três anos e, repleto de amargura e raiva, dedicou um álbum para sua ex-amada sem deixar de lado a língua ferina.
A musa não é poupada em nenhum momento, sendo desconstruída a cada canção com maciças doses de violência verbal, compostas de maneira poética e bem equilibrada entre a desilusão e a ironia.
Abrindo o disco, Eu Sei o Que Fiz é atestado de mea culpa do cantor. Good assume seus erros compartilhando a mesma situação da amada que o deixou. Expõe seu lado grotesco para, equilibrando com os defeitos dela, dar início a uma sessão que desmoronará cada aspecto da relação amorosa.
A falta de companheirismo, a relação desequilibrada, o sexismo de ambas as partes, nada é poupado. O título de cada canção evoca o estilo punk presente no rock da década mas, em contrapartida a um som agressivo, são as letras afiadas que provocam incômodo. Good faz reverência ao estilo mas insere sua personalidade nas canções autorais. Fazendo de uma canção intitulada Vômito uma discussão as avessas em que se destaca a poesia de uma cena de amor realizada como discussão, que eclode no duelo dos solos de guitarra sem perder o vigor.
A força mantida pelo álbum ainda hoje gera a reflexão a respeito do momento depressivo em que vivia o cantor, responsável pela potência das canções. Good nunca teve o merecido reconhecimento no lançamento do disco e, após uma sequencia de outros álbuns sem fôlego, foi esquecido por grande parte do público e da mídia.
O relançamento comemorativo de vinte e anos de seu único álbum primordial demonstra como o espelho da arte necessita de elementos sensíveis para se conceber. Sem a perda inestimável do relacionamento, o disco nunca veria a luz.
Ainda hoje o cantor evita falar da ex-amada, acreditando que tudo o que poderia ser dito está presente nas doze faixas. O vocabulário em que se refere à moça demonstra o quão agressiva foi o término para o cantor. “Me pedem para dizer quem é ela, quem é ela, quem é ela, afinal? Nem mesmo eu soube nos três anos de relacionamento e o melhor que fiz foi esquecer dessa puta. E gosto de puta porque simboliza tudo que senti sobre ela. Não falo da boca para fora, é triste quando você descobre que não é exatamente você que ela admira e sim qualquer homem que esteja com o membro ereto”. Se depender do cantor, a polêmica não cessará tão cedo.
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