Em silêncio, a luz do aparelho parecia irradiar mais energia, iluminando brevemente o quarto. Os contornos dela se destacavam, pintura lapidada em pedaços pelo azul luminoso. Enquanto os batimentos desciam lentamente, ele imaginou os amantes. Não a palavra que lembra os que amam, mas a acepção de um alguém que, além de estar com um amor, possui outro. Sentiu-se invadido por uma sensação de desgosto ao imaginar a dor de ter outro alguém.
Na escuridão do quarto via uma janela aberta no prédio da frente. De lá, era impossível ver o casal nu neste pequeno espaço, mas ele via a luz acesa no edifício. E se naquele prédio houvesse um amante que, neste momento, ligava para a esposa avisando que o plantão no trabalho se estenderia mais uma hora. Colocando a mão no bocal do telefone e, furtivamente, em provocação, beijasse a outra mulher, a desafiar a esposa que como um cão esperava a chegada do dono.
Tinha os pensamentos mais obtusos em momentos impróprios. Voltou a observar o corpo nu a sua frente pela velada luz do aparelho. A luz tênue parecia enganar os olhos, mas ele a enxergaria mesmo de olhos fechados. Aquele corpo como caminho predileto a percorrer.
Estavam cansados. Fechou os olhos por alguns momentos voltando a ideia dos amantes. Este corpo ao seu lado seria o de outra e ele em breve levantaria, colocaria a aliança, tentaria dar um jeito no cabelo e voltaria para a casa. Não, pensou. Horroroso demais.
Não que fosse um exemplo perfeito de bons costumes. Era assim que era e assim se satisfazia. Preferia ela por inteiro do que metades disformes que nunca se encaixariam. O sexo seria um pequeno detalhe. Mas e os passos furtivos? As histórias supostas e projetadas? A mentira de cara limpa com sabonete? Até quando um homem ou uma mulher suportaria guardar um segredo assim sem achar que está ferindo aquele que supostamente ama?
Não que fosse um exemplo perfeito de bons costumes. Era assim que era e assim se satisfazia. Preferia ela por inteiro do que metades disformes que nunca se encaixariam. O sexo seria um pequeno detalhe. Mas e os passos furtivos? As histórias supostas e projetadas? A mentira de cara limpa com sabonete? Até quando um homem ou uma mulher suportaria guardar um segredo assim sem achar que está ferindo aquele que supostamente ama?
A mulher adormecera em seu peito enquanto estava em devaneios. A respiração cadenciada lhe dava calma nesta noite de calor em que a janela continuava aberta. Mesmo que ela tivesse medo de insetos, era impossível evitar.
Ele se sentia leve por estar com ela. Lentamente tateou o caderno de anotações do criado mudo. Com a caneta em punho escreveu: qual a validade de um amor feito de mentiras se há tanta beleza no amor que não se esconde atrás de segredos?. Grifou a palavra segredos por duas vezes e pousou o caderno no criado mudo novamente. Virou para o lado, dando-lhe um beijo na testa. Amanhã trabalharia melhor nesta ideia.
08 de dezembro de 2012
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