O copo pousando na mesa fez um barulho suave, porque quem o pousava prestava toda a atenção naquilo. Não gostava de barulho, e Deus sabe o quão barulhento pode ser um copo pousado sem cuidado.
- Teve uma vez, quando eu ainda era bem jovem, que um colega ganhou uma viagem. Uma viagem das grandes, tudo pago, muito tempo, convidado para trabalhar no melhor lugar em que poderia trabalhar. Fiquei feliz por ele, o parabenizei. Ele sorriu. Semanas depois o encontrei de novo, na mesma cidade em que morávamos. Ele não tinha ido, não viajara. Por que?, perguntei. E ele disse. A namorada estava grávida, teria o filho quando ele estivesse lá fora, na viagem. Então ele tinha ficado. O sonho de trabalho, a viagem grande, tudo deixado pra lá porque o menino ia nascer. Eu era bem jovem, sorri para ele e disse qualquer coisa de que não me lembro. Por dentro eu pensava no quão estranha tinha sido essa decisão, essa desistência. Não, eu não faria isso, que absurdo, deixar a oportunidade passar, a oportunidade pra lá. Não, claro que não. Sorri porque ele estava feliz em ficar, em ver o filho nascer. Eu não ficaria.
Joana, sentada na mesa com ele, pensava naquela história. "Você não ficaria?", disse em voz baixa, um pouco triste por pensar nisso.
- Naquele tempo eu não ficaria, de forma alguma, jeito nenhum. Mas hoje, pensando mais, vivendo mais, nenhuma viagem trabalho nem nada me faria ir pra longe de esposa e filho.
Joana sorriu. Ele sorriu. Deixou o dinheiro sobre a mesa, uma larga gorjeta e se despediu. Levantou, pegou a mala que sempre o acompanhava e, andando calma e tristemente, seguiu viagem.
Ual! ...
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