segunda-feira, 26 de março de 2012

o caso ao contrário


Eu molho o pão no café e levo fé que deus é preto e fuma cachimbo. Nasce menino, cresce mulher...


- Vira a fumaça!



- Oi?



- Vira a fumaça pra lá, por favor. Não quero fumar por tabela.



- Ah...



- Hoje vi duas andorinhas.



- E daí?



- E daí? E daí que hoje eu vi duas andorinhas, uma voando atrás da outra, as duas fazendo um ninho na parte de baixo de uma sacada.



- Ou no teto da outra.



- Como?



- Era um prédio, não era?



- Aham.



- Então era na parte de baixo de uma sacada ou no teto da outra, sacada de baixo. Era um prédio, não era?



- Era, eu já disse.



- Então como não pensou nisso antes?



- Não sei. Acho que eu fiquei pensando no andar mais alto.



- Típico.



- Com assim "típico"?



- Típico. Você sempre olha pro andar mais alto e perde os outros, o térreo e todos os que existam no meio. Se tua vida fosse um arranha-céu iam faltar janelas.



Joana chega com mais cervejas. O café acaba. O pão também. Ele continua.



- Você ia dizer "é o verão chegando", não ia?



- Ia.



- E nem por um momento pensou que temos ainda toda a primavera pela frente, pensou?



- Não. Nossa, fiquei até sem graça, agora...



- Típico, foi o que eu disse. Nem pensou que hoje é primavera. Pensou só que uma andorinha não faz verão, mas duas devem fazer. Mesmo que o verão ainda esteja fora da vista.



- É...



- Pois é.



Ele continuou a fumar, como fazia antes da história das andorinhas. Pensava na primavera, nela e no verão. Ela não tinha como saber disso, então não pensava em nada, apenas tentava, ali, sentir o momento.



A fumaça ainda ia na cara dela.

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