Antes do sol bate já tô de pé. Não gosto, mas preciso. Saio de casa, desço o morro e vou pro meu lugar. Aquele que os fardados me deixam ficar sem que me dêem sopapo.
Quando durmo é por cansaço, parece que lá dentro a barriga arranha de tão vazia. Mas se vai ficando tarde e eu não consigo nada, o jeito é voltá pra casa faminto. Pobre andando na rua a noite é alvo fácil de porrada, e eu ainda não me recuperei da última.
Nunca peço em nome da minha mãe. Aquela maldita que bebe sem parar. Peço pro meu sustento, prá manter esse esqueleto magrelo em pé.
Esses dias fui pedir no sinal, e um moço me mostrou uma placa que dizia para não me dar dinheiro e sim cidadanaia ou algo assim. Eu não sei o que é isso não, mas se fô de comer, que chegue logo que minha barriga tá doendo.
Ontem eu achei que sorte tinha me encontrado, um moço parô com o carro, carro fino, magnata, e eu pensei que ia consegui um pouco pra comer. Não sou cheradô de cola. Eu quero só enche a pança pra vê o sol nascer amanhã.
Ele me perguntô se eu sabia ler, disse que não. Se eu gostava de história de aventura, e toda segunda eu via na barraca do seu João uns filmes legais naquele canal das pessoas bonitas, então disse que sim.
O moço abre a porta de trás do carro e tira uma caixa, fuça nela e dá algo que ele chamo de livro. “Pode pegar, filho. É seu. Você vai ver como isso vai mudar sua vida”.
Peguei, virei de um lado, do outro, não vi nada. Começou a chover e nem da chuva me protegeu. Fico tudo torto depois disso.
Já tentei trocar, desde ontem, com tudo que é amigo meu por um naco de pão, mas isso aqui não tem jeito. Eu só reconheço que essa letra aqui é do meu nome, Emerson, e só. Tem uns desenhos que eu fico vendo, fico vendo com força até a vista cansar pra ver se a fome passa. Mas não tem jeito não.
O que eu faço, hein? Enquanto eu não sei ler e tudo que eu coloco pra dentro é o ar? O que eu faço quando peço comida e acham que eu sou ladrão ou me mandam trabalhá. Ninguém me dá trabalho, senhor, começam a olhar pelo cabelo e já dizem que “aqui marginal não trabalha”.
Quem vai encher minha barriga quando ela estiver vaziazinha e eu estiver tombando de fome? Hein, doutô? A porra desse livro aqui? Não, senhô. Não.
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