Minha avó me ensinou a rezar. Como contas do rosário, repassava frase a frase de Ave Maria até que, um dia, aprendi. Orei muitas vezes por ela na época em que acreditava em um Deus magnânimo. Não por ela, exatamente, isso aconteceu somente depois do infarto, mas por causa dela.
Tempo depois, um amigo ensinou que eu não precisava repetir uma invocação para falar com o Divino. Desse dia em diante fundamentei que, se há um ser superior, e se as escrituras estão certas, ele é feito à minha imagem e semelhança. Meu Deus é Gordo, toma Coca-Cola, e joga damas com o Diabo, que continua o seu melhor amigo mas, por questão mercadológica, eles mantêm a disputa direita versus esquerda.
A imagem que concebi do Senhor foi a de um mestre. Não à toa ele tinha riso frouxo, bigode branco e, mesmo tendo enterrado um filho, ainda era capaz de sorrir. Concebi meu salvador na figura de um professor que, como explicita sua função, esteve comigo por pouco tempo, mas muito me ensinou.
A prece, a avó, Deus, o professor, vieram à tona porque hoje eu quis rezar. Depois de anos procedendo poucas palavras para o céu, eu quis rezar. Cruzei as mãos e comecei um discurso, como quem pede desculpas fajutas a um velho amigo pela inadimplência. Descobri ter simpatia pela cadência das palavras. Recordei quase rindo a dificuldade de algumas passagens rebuscadas. Então, rezei.
Nada mudou quando findei. Mas eu estava em paz. Estupidamente, eu entendi que não importava Deus. O que valia era o caminho, a maneira rimada ou prosaica de ser ciente de sua finitude para saborear o meio.
Demorei trinta anos para isso.
Simplesmente fantástico esse conto! :)
ResponderExcluirTexto muito bom Thiago. Sempre venho ao Clube e leio vc e por falta de tempo nao comento, porém, "Reza" é incrivel e nao resisti. Parabéns. Ana Eliza.
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