segunda-feira, 7 de outubro de 2013

fodam-se os bandeirantes

Entre uma cerveja e outra, Skol, que é palavra flamenga, Brahma, palavra hindu, Kaiser, palavra alemã genocida vinda do latim caesar imperialista, entre uma cerveja e outra lia algumas coisas, ouvia a fala da terra.

"E para nós, arte é a outra coisa. Ela não serve para contemplar pedras, mas para transformar corpos e espíritos. Para nós, arte é o corpo transformado em vida e liberdade."

- Do que ele tá falando?

- Oi?

- Esse cara aí. Qual o nome dele? Tupã de Deus?

- Hm, não. Marcos Tupã. Líder indígena. Ele tá falando do monumento lá em sampa, o Deixa que Eu Empurro.

- Nome engraçado.

- Chama "dos Bandeirantes", ou "das Bandeiras". Alguma coisa assim. O pessoal manchou de tinta vermelha, esses dias, na manifestação indígena. Sangue, disseram. Simbolizava sangue.

- Por quê?

- Porque os bandeirantes encheram o país de sangue de índio, por isso. Olha que legal: "marchamos em direção a essa estátua de pedra, chamada de Monumento às Bandeiras, que homenageia aqueles que nos massacraram no passado. Lá subimos com nossas faixas, e hasteamos um pano vermelho que representa o sangue dos nossos antepassados, que foi derramado pelos bandeirantes, dos quais os brancos parecem ter tanto orgulho. Alguns apoiadores não-indígenas entenderam a força do nosso ato simbólico, e pintaram com tinta vermelha o monumento. Apesar da crítica de alguns, as imagens publicadas nos jornais falam por si só: com esse gesto, eles nos ajudaram a transformar o corpo dessa obra ao menos por um dia. Ela deixou de ser pedra e sangrou. Deixou de ser um monumento em homenagem aos genocidas que dizimaram nosso povo e transformou-se em um monumento à nossa resistência. Ocupado por nossos guerreiros xondaro, por nossas mulheres e crianças, esse novo monumento tornou viva a bonita e sofrida história de nosso povo, dando um grito a todos que queiram ouvir: que cesse de uma vez por todas o derramamento de sangue indígena no país!"

- Grande, hein?

- O quê?

- A citação.

- Porra, bicho. Grande é a causa. Grande é a coisa. Sério, cara, sério, ouve isso: "Deixou de ser um monumento em homenagem aos genocidas"! Ouve isso, cara. A gente, branco de merda, homenageia genocida. Ho-me-na-geia GENOCIDA. Isso te parece legal?

- Não. Não parece, mesmo.

- Pois imagino que nem seja. Ainda bem que a gente só tem que se preocupar em tomar cerveja e não em matar ninguém.

- Ninguém.

- Ninguém.






[não sendo mera especulação histórica e literária, mera criação, eis aqui onde sacar mais sobre o caso: http://revistaforum.com.br/blog/2013/10/monumento-as-bandeiras-homenageia-genocidas-que-dizimaram-nosso-povo-diz-lideranca-indigena/

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